5 de janeiro de 2009

décimo sétimo

nota: alguns problemas internéticos obrigaram-me a escrever este post num ponto de internet na vila, pelo que nao encontrei, no teclado, o til e o cê cedilhado; as minhas desculpas se tal dificultar a leitura (embora eu saiba que o leitor é versátil e deve bastante ao trabalho neuronal); assim que puder, corrijo-o no meu próprio computador; ¡saludos!

A Argentina recebeu-me fresca e muito tranquila. Esperava o calor irrespirável que fazia quando a deixei e, em vez disso, fui recebida com um suave tempo de primavera. Nem as cigaras se davam ao trabalho, na noite em que cheguei, de camisola ainda vestida. Nessa frescura da madrugada, o CIES escuro e quase vazio, silencioso, cheirei de novo este lugar. Está diferente. Perguntei à Jen. Nao achas que está diferente? Encolheu-me os ombros, disse que havia chovido muito nos dias anteriores. E que o seu nariz nao era bom. Tenho a certeza que está diferente.

Continua a surpreender-me como, vinda do Brasil, me sinto em casa deste lado da fronteira, onde se fala uma língua que nao é minha.
No aviao que me transportou do Rio de Janeiro para a Foz do Iguacu, calhou ficar sentada ao lado da única argentina do vôo. Que respirava com dificuldade, escondia a cara entre as maos e tremia muito. Até entao nao a sabia argentina, mas quando me agradeceu o copo de agua que lhe fui buscar com um atrapalhado “gracias”, foi quase como se me tivesse dito obrigada. Tive de imediato aquela sensacao que se tem ao encontrar um português no estrangeiro, esse saber que se partilha algo – nem que seja, neste caso, que a outra pessoa nao vai fazer caretas ao tomar mate (como verifiquei acontecer em cem por cento dos casos em casa).

Sós argentina? No, soy portuguesa. Ah... yo vivo en España hace veinte años. E assim comecaram três horas de conversa com a Iris, uma cinquentona a quem, passada a crise de claustrofobia, nao faltava boa disposicao. Falou-me da familia, dos amigos, das saudades que sente do seu país e, também, da Galiza que muito admira e visita. De Madrid, onde vive, nao gosta. Uma cidade grande é sempre uma cidade grande.

Dei-me conta que ambas falávamos um misto de "espanhol" e "argentino", mas que esse intermédio nao se assemelhava entre si. Eu nao conheco expressoes espanholas, uso as argentinas numa entoacao mais neutra. Ela falava com o encantador cantar argentino, mas soltava exclamacoes que aqui nunca oico. A cada "joder" eu até estremecia! Teve piada. Às tantas, virou para mim a capa do livro que levava no colo. A psiquiatria do pânico - truques para superar. Franziu o nariz e, em jeito de segredo, sussurrou: nao funciona.

No dia seguinte já as quatro caminhávamos floresta afora, em busca do grupo "Silver". Entardecia e a vontade era mais de conversar que de ser monera. Mas lá os encontrámos. E continuou-me a parecer que as coisas estavam diferentes. Nao havia mosquitos. Nao transpirávamos. Tudo cheirava maravilhosamente a madeira (há uma certa árvore que cuja casca tem um cheiro a dociado a flores) e, por vezes, à planta que tem odor a limao. Reapareceram alguns fungos. E a luz do entardecer está magnífica - ou talvez tenham sido os dez dias de inverno europeu que me alteraram os sentidos.

Além de tudo isto, passa-se que há vento. Aqui, normalmente, só há vento quando há tormenta e é daquele género que faz o mundo vir abaixo, as árvores dobrar-se até ao limite e, embora seja também fantástico, é muito difícil de disfrutar de dentro de casa. Assim, este novo tipo de vento, mais familiar, é uma boa surpresa. Tem laivos dos dias em que Portugal comeca a aquecer e nao podia cair melhor para rematar o meu curto inverno.

Trouxe vinho do porto para todas, "O Papalagui" para a Mica e uma pilha de outros livros para mim. Sei que a Clara trará filmes novos. Troquei também alguma roupa e passeio-me agora com modelitos que fogem às três toilettes anteriores. Dizem-me que é estranho. E trouxe fado, a pedido (obrigada Joao), bem como música pimba (sim, nao é mentira, foi-me pedida música pimba!). Cultura nao discriminatória e seu transporte além-mar, à boa maneira portuguesa.

O que me custa? As saudades de todos. Mais uma despedida, mais algumas caras compridas - embora menos lágrimas desta vez. Nao estar para assistir à tal primavera. Nao poder ver o mar quando quero. Perder bons filmes nos cinemas e aniversários a tempo e horas. Que nao seja época de laranjas e tangerinas aqui. Que o lume nao sirva para aquecer mas sim, apenas, para cozinhar carne. Apesar de tudo, uma conclusao tiro da minha estadia em Lisboa: adoro a minha casa, adoro estar à distância de um "vem cá ter", mas a cidade nao me trata bem. É intensa demais, agressiva de mais, impessoal demais. Falta-lhe tempo para ter tempo.

Chegada ao parque, respirei fundo e tranquilizei-me.

4 comentários:

Unknown disse...

diz-me se a argentinita gostou :)

bjnhs e bons tropicos

Aline Cortez disse...

Eu também gostaria de saber se a Mica(s) Argentina gostou da música p...., que me coube a mim fornecer.
Estou segura, que esse fantástico país acolherá entusiasticamente o acervo musical que espelha a nossa alma lusa (ou pelo menos a minha).
Quem poderá representar de forma fiel o que são a visão e os valores deste grande povo habitante da Ocidental Praia Lusitana ? A Mariza ou a Rute Marlene ?
Quem melhor que esta última para apresentar ao Mundo Novo a nossa "berdadeira" cultura ?
Convicta que o "apito do comboio" está condenado ao sucesso, fico a aguardar novas desse lado.
Bjs
PS - e não referiste as latas de atum

Ines S disse...

bem, ainda hoje estive a mostrar clips de musica pimba portuguesa a um alemao. LINDO!!
terao de ver os sucessos de Agata com a sua lingerie vermelha, unhas cor-de-rosa, Marco Paulo com cabelo à David Hasselhoff anos 80... As delicias do youtube ao ver esses clips!
se o teu 'tempo de antena' no modem te permitir, mostra-lhes tambem esses tesouros da nossa musica pimba!
Quanto ao sentir um sentimento de regresso a casa aquando a chegada ao Parque, acho-o perfeitamente natural. Nao imaginas as saudades que as vezes sinto da minha casa em Paris quando estou em Portugal, das minhas rotinas de agora, do meu cantinho... Parece muito bizarro, mas na verdade em cada um dos lugares sinto saudades do outro.
E como diria Alvaro de Campos aka FP: Ah não ser eu toda a gente e toda a parte!
Beijoca,
Inês S.

sara disse...

aline,
sim, parece que gostou bastante, já sabe cantarolar um ou outro refrão... a Taylor, por seu turno, diz que é a pior coisa que já ouviu. E olha que nem sequer entende a letra!! lol. acho q é por isso nao percebe a piada.

inês,
não me tinha lembrado da ágata! realmente há-que colmatar essa falta! assim que possível. :)
gostei dessa do Alvaro de Campos, sinto muito o mesmo.
bjocas